Muito se tem falado no Brasil sobre apropriação cultural da cultura africano-brasileira. Digo africano-brasileira concordando com a formulação e perspectiva do Africano-Brasileiro de Marco Aurélio Luz (LUZ, 1995)1. Estas inspiram a ressignificação sociocultural; a história e as formas de enfrentamento ao tráfico transatlântico. Traz a epistemologia do africano-brasileiro aprofundada no Programa Descolonização e Educação da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) desde os anos de 1980 (BARRETO, 2016).
Observo que quando muitos falam sobre apropriação cultural tratam da seguinte forma, como se as pessoas brancas não pudessem usar tranças ou turbantes. A apropriação cultural é a adoção de alguns elementos específicos de uma cultura por um grupo cultural diferente. Ela descreve aculturação ou assimilação, mas pode implicar uma visão negativa em relação a aculturação de uma cultura minoritária por uma cultura dominante. É digno de nota que o turbante tendo origens na África ou em qualquer outro lugar não pode ser proibido que qualquer pessoa use, assim como as tranças. (Geledés).
Para a professora de inglês e português Claúdia Anunciada2 “Diversos símbolos da cultura negra estão em alta, mas nas mãos de pessoas brancas”. Geralmente esta apropriação gera lucros para só brancos. Sim, estão, e os negros não usufruem daquilo que criam. Esta apropriação, se observarmos inicia com a ideia de nacionalização brasileira. Primeiro a capoeira, depois o samba, na sequência as escolas de samba, o funk, o rap, os turbantes, as tranças, as estampas etc.
No caso da capoeira. A ideia de nação era importante e com ela forjar a identidade nacional. Assim, Getúlio Vargas na década de 1930 reconhece a capoeira como esporte nacional, mas antes disto os brancos a praticavam, os estudantes da Escola de Medicina e de Direito. Desta forma foi sugerido que os capoeiristas tivesse a carteira profissional assinada ou fossem estudantes. Sim, nesta época isto era possível para a população negra? Além disto, foram acrescentados alguns golpes de jiu jitsu para atender à pouca mobilidade dos brancos, pois estes não tinham tantas habilidades com os golpes. A capoeira para ser aceita foi branqueada e surge com isto a capoeira Regional, capoeira em cima, diferindo da Angola com movimentos sutis e mais próximos ao chão.
O samba. Também um produto nacional, mas não podia se internacionalizar na pele de um negro, assim, Carmen Miranda (1909-1955) leva o samba além das fronteiras nacionais. Uma portuguesa, não uma brasileira muito menos negra. O vídeo abaixo explicita o regionalismo mostrando o Rio de Janeiro enquanto a música retrata a Bahia e a baiana.
Acrescentando as Escolas de Samba do Rio de Janeiro em que mão estão, que as patrocina e organiza os desfiles e quem são as Rainhas das Baterias.
O
funk, divulgado nas peles de negros de
pele
clara
a
exemplo Anita e Popuzuda. Pouco vemos os(as) funkeiros(as) negras(os)
divulgadas(os)
na mídia. A Timbalada, um bloco carnavalesco soteropolitano,
idealizado por Carlinhos Brown. Este inventou o Arrastão da
Timbalada, que arrastava multidão na quarta-feira de cinzas. A
ideia era que o vendedor ambulante que trabalhava durante todo o
carnaval tivesse o seu momento de desfrutar da festa. Mas, neste dia
logo
atrás vinha Ivete Sangalo sobre o trio Madeirada. Depois o Arrastão
da Timbalada se trasnformou no de Ivete Sangalo, tendo Brown o seu
criador como convidado. Agora
com vergonha, admitem a Brown a sua criação. O rock and roll, quem o inventou Chuck Berry, mas Elvis Presley era o rei e quem usufruiu dele no mercado fonográfico?
Vivemos
a apropriação cultural no nosso cotidiano, nela
o negro sempre perde finaceiramente.
O branco não aguenta ver as exitosas
invenções
do preto e logo se apropriam e buscam
empresariar,
logo após dão um golpe,
o da apropriação.
Os negros, criadores, ficam para traz, mas
de certa forma aceitam e
continuam sustentadno o branco. O
Ilê Ayiê tem uma música que diz: Branco
se você soubesse, o valor que o preto tem, tu tomava banho de piche
e ficava peto também, não te ensino a minha malandragem, nem tão
pouco a minha filosofia. Quem dá luz a cego é
bengala
branca e Santa Luzia. Mas,
na verdade o negro brasileiro almejando sempre a aceitação do
branco sempre dá a luz ao seu oponente dissimulado. Observemos o
cantor branco na banda Afro Olodum. Ainda não vi brancos
fazerem isto com pretos(as). Os negros criam a Axé Music, mas os
rei é Luiz Caldas e a rainha Daniela Mercury.
Observo
que
na
festa de Iemanjá no Rio Vermelho, no dia 2 de fevereiro,
quando chegamos pela manhã, por volta das
5 a 6 horas
a maioria de pessoas encontramos fazendo as oferendas são brancas, e
os pretos
estão
tocando
tambor. Muitos
deles
por
força da alienação e conversão ao neopentecostalismo, abominam a
cultura africano-brasileira. Quem
ganha com esta festa são os empresários do ramo do turismo,
eventos, cervejarias
etc.
Já
o
povo preto, neste
caso
para
garantir
o seu sustento, o
faz
como vendedores ambulantes pagando taxas para a prefeitura e
comprando diretamente das cervejarias os produtos de acordo com o
decreto municipal.
Da mesma forma o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro. Quem
ganha com isto? Os
evangélicos por sua vez querem aumentar sua renda e vendem o
Acarajé, apelidando-o de bolinho de Jesus e a capoeira a de Jesus.
Devemos
lembrar que esta apropriação é mais grave quando retira dos pretos
a sua invenção, os seus créditos e dando ao usurpador o bônus
financeiro onde a população negra nada ganha com a sua própria
criação e
permanece na pobreza e visibilidade negativa. E um detalhe importante
não somos maioria e precisamos cuidar e reivindicar o que é nosso.
Notas
1Para compreender a epistemologia da epistemologia do africano-brasileira está disponível em: LUZ, Narcimária Correia do P Atrocínio. AGADÁ: abrindo caminhos para a afirmação da epistemologia africano-brasileira. 2011. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ccrh/v24n62/a15v24n62.pdf>. Acesso em: 15 out. 2011.
2Entrevista da Revista Claudia. Disponível em: <https://claudia.abril.com.br/sua-vida/patricia-anunciada-simbolos-da-cultura-negra-apropriacao-cultural/>.Acesso em: 08 set. 2017.